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domingo, 29 de abril de 2018

A HISTÓRIA BRUTAL E QUASE ESQUECIDA DA ERA DE LINCHAMENTOS DE NEGROS NOS EUA

Em 2005, o Senado dos Estados Unidos pediu desculpas por não ter aprovado uma legislação proibindo linchamentos GETTY IMAGE

* ATENÇÃO: ESTA REPORTAGEM CONTÉM CONTEÚDOS PERTURBADORES.

Em 1904, o afro-americano Luther Holbert foi amarrado a uma árvore em Doddsville, no Estado americano do Mississippi, por uma multidão que o acusava de matar um fazendeiro branco. Naquela época, os Estados Unidos viviam um período de violência e segregação raciais.

Junto de Holbert, também presa a uma árvore, estava uma mulher - acredita-se que era sua esposa. Ambos foram obrigados a erguerem as mãos. Em seguida, seus dedos foram cortados um a um, e depois jogados para a multidão, como uma espécie de souvenir macabro. Suas orelhas também foram cortadas.

Além disso, os dois foram espancados. Uma espécie de saca-rolhas foi usada para fazer buracos em seus corpos e retirar pedaços de suas carnes. Finalmente, Holbert e a mulher foram jogados em uma fogueira e morreram queimados.
A tortura e o assassinato de Holbert e da mulher desconhecida foram assistidos por uma multidão de homens, mulheres e até crianças, todos brancos. Enquanto presenciava o linchamento, o público comia ovos recheados e bebia limonada ou uísque, com a mesma atitude tranquila de quem está fazendo um piquenique.

Este episódio de linchamento brutal está longe de ter sido o único nos Estados Unidos. Entre 1877 e 1950, 4,4 mil pessoas foram linchadas no país, segundo registros da Iniciativa por uma Justiça Igualitária (EJI, na sigla em inglês), uma organização não governamental. A grande maioria delas eram pessoas negras.

É o que os historiadores chamam de "era dos linchamentos". Não era uma forma de fazer justiça pelas próprias mãos. Tratava-se, na verdade, de crimes raciais.
Mais de 4,4 mil afro-americanos morreram durante a 'era dos linchamentos' GETTY IMAGES

Linchamentos foram anunciados nos jornais da época

A "era dos linchamentos" se estendeu até meados do século 20. Seu ápice foi entre 1890 e 1930, explica Stewart Tolnay, professor de Sociologia da Universidade de Washington.

Em alguns casos, inclusive, eram publicados anúncios nos jornais, convocando as massas para participarem. "Três mil pessoas vão queimar um negro", dizia uma notícia do New Orleans State, de 1919. "John Hartfield será linchado por uma multidão de Ellisville às 5 da tarde de hoje", falava o Daily News de Jackson, Mississipi, do mesmo período.

"Os casos em que os linchamentos foram anunciados nos jornais são poucos, ainda que tenham resultado em algumas das maiores multidões. Mais frequentes foram os casos em que massas pequenas detinham e linchavam alguém, a quem acusavam de ter cometido um tipo de crime. Eram eventos rotineiros e silenciosos", indica Tolnay, que publicou dois livros e diversos artigos sobre o tema.

O fato de estas mortes poderem ser anunciadas na imprensa, com antecedência, demonstra que não se tratava de ações impulsivas executadas por uma turba exaltada. Havia um planejamento. Some-se a isso que era muito raro que os linchadores fossem julgados.

A EJI destaca que as mortes não eram resultado da ação de uns poucos extremistas, mas sim atos públicos violentos que contavam com a participação de toda uma comunidade. Além disso, eram toleradas pelas autoridades e os responsáveis não enfrentavam nenhum tipo de consequência legal.

"Os linchamentos eram atos de violência racial que estavam no centro de uma campanha sistemática de terror que perpetuava e respaldava uma ordem social injusta. Estes linchamentos eram terrorismo", aponta a organização em seu informe.
Público de um linchamento de afro-americanos em Indiana, em 1930 GETTY IMAGES

De supostos crimes ao simples fato de esbarrar em brancos

A maior parte de vítimas de linchamentos era negra. Entre 1882 e 1889, a proporção era de 4 negros para cada branco. Posteriormente, entre 1890 e 1900, aumentou para 6 negros para cada branco. Depois disso, chegou a 17 para 1.

Segundo o estudo da EJI, cerca de 30% dos afro-americanos linchados foram acusados de homicídio. Outros 25% foram acusados de agressão sexual. "A definição de violação sexual de um negro a uma branca no Sul dos Estados Unidos era incrivelmente ampla. Não era necessário o uso da força, porque a maior parte dos brancos rechaçava a ideia de que uma mulher branca poderia consentir uma relação sexual com um negro", considera a organização.

Outras centenas de negros perderam a vida acusados de provocar incêndio, praticar roubo ou simplesmente por "vadiagem".

Havia acusações mais banais. Segundo o estudo da EIJ, o afro-americano Jesse Thornton foi linchado em Luverne, Alabama, em 1940 por ter se referido a um policial pelo nome, e não por "senhor". Já em 1916, Jeff Brown foi linchado em Cedarbluff, Mississipi, por tropeçar acidentalmente em uma jovem branca enquanto corria para pegar o trem. O soldado Charles Lewis foi linchado em 1918, em Hickman, Kentucky, por se negar a esvaziar os bolsos enquanto estava vestindo seu uniforme militar.

O professor Stewart Tolnay aponta que os linchamentos não eram uma forma de justiça popular frente a um sistema de justiça oficial que não funcionava.

"Havia um sistema penal perfeitamente adequado que podia lidar com os delinquentes, fossem eles brancos ou negros. O linchamento dos negros tinha um objetivo diferente: deixar uma mensagem muito clara para a comunidade negra de que havia limites para sua ascensão social", afirma Tolnay.

Já os brancos que eram linchados costumavam fazer parte de uma camada marginalizada da sociedade, explica Tolnay. Eles "nunca eram linchados pelos motivos banais pelos quais os negros eram mortos. Além disso, não costumavam sofrer torturas", afirma Tolnay.
Depois da Primeira Guerra Mundial, os linchamentos recomeçaram pela ação de grupos supremacistas, como a Ku Klux Klan GETTY IMAGES

Negros foram privados de direitos

A "era dos linchamentos" teve seu epicentro no Sul dos Estados Unidos. Se iniciou depois do fim da Guerra Civil americana e da declaração formal de fim da escravidão, em 1863. Para os pesquisadores, não se trata de coincidência.

"Depois da Guerra Civil, cerca de 4 milhões de escravos negros se tornaram livres e passaram a competir com os brancos (por empregos) nas economias dos estados do Sul", explica Tolnay.

"Os negros foram ameaçados até que ficaram completamente privados de direitos de participação política, por volta do ano 1900, e o Sul ficou governado pelo sistema de castas raciais, no qual havia uma clara linha de separação entre a 'raça branca superior' e a 'raça negra subordinada'".

"Os brancos ricos eram a elite e os brancos pobres usavam o linchamento para reforçar esse sistema de castas raciais e reduzir as probabilidades de ascenção social dos negros do Sul", acrescenta.
Afro-americanos fugiram do Sul para o Norte

Os linchamentos foram uma das causas da migração massiva de cerca de 6 milhões de afro-americanos do Sul para o Norte dos Estados Unidos, entre 1915 e 1970. No Norte, se estabeleceram em guetos.

Essa redistribuição da população reduziu a disponibilidade de mão-de-obra barata no Sul, algo que segundo Tolnay pode ter convencido as elites do Sul sobre a necessidade de mudanças.

"Os linchamentos se converteram em algo vergonhoso para o Sul, à medida que a economia se desenvolvia. A elite branca tentava atrair capitais externos, então precisava mudar a imagem do Sul. Essa era uma prática brutal, espantosa e desumana, que não ajudava", assinala o professor.

Deste modo, o fenômeno foi se reduzindo até acabar. Mas sem que, segundo a ONG EJI, houvesse um processo de reconhecimento da brutalidade do passado e de reconciliação, como ocorreu na Alemanha com relação ao Holocausto ou na África do Sul sobre o apartheid.
Depois da abolição da escravidão, em 1865, aumentaram os ataques racistas contra os afro-americanos GETTY IMAGES

Monumento para lembrar as vítimas

Apesar de ser uma parte importante da história dos Estados Unidos, a "era dos linchamentos" é pouco conhecida. Para mudar isso, em 26 de abril, foi inaugurado o Monumento Nacional pela Paz e Justiça em Montgomery, no Estado americano do Alabama.

"Diga o nome de um afro-americano linchado entre 1877 e 1950? A maior parte das pessoas não conhece nenhum. Milhares de pessoas morreram, mas não se pode nomear uma sequer? Por quê? Porque não temos falado sobre isso", comentou Bryan Stevenson, fundador da EJI, sobre o motivo por trás da criação do Monumento.

O Monumento espera apresentar para o público o contexto da história do terror racial nos Estados Unidos, com o uso de recursos artísticos. Além disso, foram criados mais de 800 memoriais de aço de cerca de 2 metros de altura, um para cada condado dos Estados Unidos onde afro-americanos foram linchados. Neles, estará grafado o nome das vítimas.

Cada um desses monumentos tem uma réplica, que a EJI espera entregar para as regiões correspondentes. A ideia é que as esculturas sejam expostas nos próprios locais, recordando as histórias de linchamento.

Para os responsáveis da EJI, o número de regiões que solicitarem o envio dessas réplicas será um indicador de quanto se avançou no caminho da verdade e da reconciliação.

AUTOR: BBC

sexta-feira, 27 de abril de 2018

SAIBA QUEM ERAM OS 3 AMIGOS DISSOLVIDOS EM ÁCIDO, EM CRIME QUE CHOCOU O MÉXICO

Salomón Aceves, Marco García e Daniel Díaz foram assassinados por bandidos de um cartel de drogas de Jalisco ao serem confundidos com membros de facção rival quando voltavam de uma filmagem para a universidade

A divulgação de detalhes sobre o assassinato de três estudantes de cinema no Estado de Jalisco, no oeste do México, chocou novamente o país, que já tem mais de 200 mil homicídios registrados na última década.

Javier Salomón Aceves, Marco García e Daniel Díaz foram sequestrados (em 19 de março), mortos e tiveram seus corpos dissolvidos em ácido por membros de um cartel de drogas, o Jalisco Nova Geração (CJNG).

Os três estudantes voltavam para casa depois de concluir um projeto da faculdade nos arredores de Guadalajara, a segunda maior cidade do México, quando foram interceptados pelos criminosos.

Eles teriam sido confundidos com membros de um grupo rival da CJNG, de acordo com a investigação da Promotoria de Jalisco.

A BBC Mundo, o serviço em espanhol da BBC, conta o que se sabe sobre esses três estudantes assassinados e o que esse crime diz sobre a situação da violência no país.
O desaparecimento dos três estudantes de cinema, que após um mês revelou-se foram assassinados cruelmente, gerou manifestações em cidades do México Javier Salomón Aceves Gastélum/AFP

Javier Salomón Aceves Gastélum
Javier Salomón Aceves Gastélum, conhecido como "Salo", tinha 25 anos e era da cidade de Mexicali. Ele estudava cinema na Universidade de Meios Audiovisuais de Guadalajara.

Sua irmã Michelle escreveu uma mensagem na página que ele tinha no Facebook. Ela o descreveu como uma pessoa muito dedicada, apaixonada pela cinematografia.

"Me deixa triste que tenham interrompido assim seus sonhos. Eu sei que você tinha um futuro, dava para ver como você segurava sua câmera, como dirigia", escreveu ela.

"Havia cores em você, uma luz que brilhava em seus olhos com tantas ideias e imaginação que você tinha, você nunca estava em branco."

Outra de suas paixões era tocar bateria.

Ele tocava com uma banda chamda Betray Me, que também publicou uma mensagem de despedida: "Até sempre, irmão. Você sempre viverá em nossos corações, você foi e será parte essencial deste projeto".

Marco Francisco García Ávalos
Marco Francisco García Ávalos era de Tepic, a capital do estado de Nayarit, e tinha 20 anos.

Ele estava terminando o segundo semestre da faculdade de cinema. Segundo colegas ouvidos por jornais de Jalisco, sua especialidade até então era a edição de vídeo e o gerenciamento de programas de pós-produção.

"Seu sonho era ser o melhor diretor e ninguém duvidava disso, porque todos sabíamos o quão talentoso ele era e o dom que tinha para se comunicar com as pessoas", disse a amiga Aylin Michelle ao jornal El País.

Ela também o descreveu como o garoto que "dava diversão" aos encontros dos amigos.

Jesús Daniel Díaz García
Daniel Díaz gostava de futebol e compartilhava no YouTube vários dos vídeos que fazia DANIEL DÍAZ/CAAV

Jesús Daniel Díaz García, também de 20 anos, era originalmente da cidade de Los Cabos, no Estado de Baixa Califórnia do Sul.

Ele frequentemente compartilhava seus trabalhos audiovisuais em uma plataforma da universidade.

Díaz García também gostava de jogar futebol. Quando foi sequestrado, usava muletas por conta de uma lesão que sofreu jogando futebol.

Seus colegas se lembram dele por sua alegria e por ser uma pessoa muito calma.

"Fazíamos os trabalhos da faculdade juntos, nos encontrávamos em minha casa para fazer vídeos, para escrever roteiros", disse uma colega ao jornal Mural.

Vários dos vídeos que os três estudantes fizeram juntos foram compartilhados pelo YouTube.

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O que esse crime diz sobre a situação no país?

O governo de Enrique Peña Nieto começou com índices de criminalidade em queda, em contraste com as altas taxas de homicídios durante a gestão de Felipe Calderón.

Segundo analistas consultados pela BBC Mundo, essa queda gerou a percepção errônea de que a segurança no país estava melhorando.

No entanto, Pienã Neto, que termina o seu mandato de seis anos agora em 2018, terá a mais alta taxa de homicídios durante uma gestão presidencial desde que os registros oficiais começaram, em 1997.

Para o acadêmico e especialista em segurança nacional Javier Oliva, da Universidade Nacional Autônoma do México, o caso dos três estudantes mortos em Jalisco é "um sintoma de como a violência no México está longe, muito longe de ser controlada".

O tipo de violência usada contra Salomón, Ávalos e Díaz reflete os níveis de crueldade que organizações criminosas atingiram, diz o acadêmico.

"Isso nos lembra de como a crueldade extrema e desumana tem aumentado, se é que a crueldade pode ser categorizada de qualquer outra forma", diz ele.
Especialistas alertam para o aumento da crueldade nos crimes no México e para a vulnerabilidade dos jovens AFP

Por sua vez, Francisco Rivas, diretor do Observatório Nacional do Cidadão, uma ONG que monitora os índices de insegurança no país, aponta que esse tipo de crime expõe a falta de controle que o governo tem sobre o território mexicano.

Neste caso, os estudantes universitários realizavam um projeto da universidade e foram sequestrados em Tonalá, um município de Guadalajara, a segunda maior cidade do México.

"Se há algo que expõe a fraqueza do Estado são os desaparecimentos, porque onde há desaparecimentos o Estado não controla o território", diz Rivas à BBC.
A Procuradoria de Jalisco informou nesta semana detalhes sobre o assassinato dos três alunos GETTY IMAGES

O governador de Jalisco, Aristóteles Sandoval, havia solicitado um prazo de 15 dias para se resolver o desaparecimento dos jovens, mas a investigação levou 34 dias para ter seus resultados apresentados.

Para Rivas, "o Estado é incapaz de ter uma resposta rápida e pronta, há debilidade para se investigar crimes, há uma violação dos direitos dos cidadãos e falta de acesso à verdade e à justiça para as pessoas".

Por que os jovens?

Como indicam dados do Instituto Nacional de Estatística e Geografia do México, entre as cerca de 210 mil vítimas de homicídios ocorridos de 2007 a 2016, mais de 107 mil eram pessoas de 15 a 34 anos.

E, em média, para cada mulher que foi morta, oito vítimas eram homens.

Embora parte desses números se explique pelo fato de a maior parte da população mexicana ser jovem, o diretor da ONG também aponta para condições sociais e econômicas.
Um dos acusados de matar os três estudantes é um jovem de 20 anos, identificado pelas autoridades como Omar N.

"Os jovens estão mais expostos ( à violência) em seu cotidiano", diz Rivas, porque além de sofrerem com a falta de respeito a seus direitos humanos, também carecem de espaços para estudo e trabalho.

"Eles podem entrar no tráfico de drogas ou no crime organizado porque é o mercado que mais facilmente os recebe, onde há potencialmente mais renda do que em um mercado de trabalho legal. Mas também há aqueles que entram porque são forçados a isso", diz ele.

Além dos homicídios, registros oficiais indicam que das 34 mil pessoas desaparecidas no México, 35% têm menos de 29 anos de idade.

Em uma declaração incomum e feita conjuntamente na quarta-feira, 25, a Universidade Autônoma do México e a Universidade de Guadalajara, disseram que "não é possível continuar assim". No texto, dizem que cada assassinato de um jovem representa uma investigação fracassada, uma família quebrada e uma esperança perdida.

"A escalada da violência e a impunidade desenfreada estão presentes em todos os cantos da nossa nação", diz o comunicado. "Exigimos ações imediatas para parar e erradicar essa violência a qual todos nos ressentimos e a qual não merecemos."
Manifestante segura cartaz dizendo 'Estão desaparecendo com a gente' em protesto contra o desaparecimento dos universitários EPA

AUTOR: BBC

domingo, 22 de abril de 2018

A LEGIÃO FANTASMA

"Poderiam soldados mortos de uma forma misteriosa em um passado distante, voltar com um objetivo obscuro?".

O relato a seguir descreve esse macabro acontecimento!

Em uma noite no mês de setembro de 1974, o escritor A. C. McKerracher decidiu fazer um intervalo em seu trabalho e saiu de casa para respirar um pouco de ar fresco.

McKerracher e a família acabavam de mudar-se para uma casa nova, no alto de um morro, na pequena cidade de Dumblane in Perthshire, Escócia [Coordenadas GPS: Latitude / Lontigude = 56°11'18.71"N, 3°57'41.10"W].

A noite estava clara e úmida, e a cidade, a seus pés, coberta pela neblina.

De repente, o silêncio foi quebrado pelo que lhe pareceu o ruído do movimento de um grande grupo de pessoas atravessando os campos.

Imaginando que devia estar tendo alucinações pelo excesso de trabalho, McKerracher decidiu entrar.

Mas, vinte minutos depois, intrigado pelo que poderia estar acontecendo, saiu outra vez e descobriu que os ruídos estavam mais altos e mais próximos do que antes.

Dessa vez parecia que poderosa legião marchava do outro lado das casas daquela rua.

- Fiquei pregado no chão, enquanto pessoas que eu não podia ver passavam por mim - recordou ele.

- Os caminhantes deviam ser milhares de pessoas, pois o ruído dos passos prosseguia sem parar.

Nessa altura, já temendo pela sanidade mental, McKerracher resolveu voltar para dentro de casa e foi diretamente para a cama.

Uma semana depois, quando visitava um casal idoso que morava perto, ele ouviu uma estranha história.

- Tarde da noite, na semana passada, nosso gato e nosso cachorro acordaram abruptamente e passaram a agir de maneira esquisita, os pêlos eriçados - narrou o velho.

- Parecia que eles estavam vendo alguma coisa que atravessava os campos, durante uns vinte minutos.

Os animais aparentavam estar com muito medo.

McKerracher não lhes contou nada sobre a própria experiência.

Contudo, o curioso comportamento dos animais ocorreu exatamente no mesmo horário em que ouvira a legião invisível, uma semana antes.

Em busca de explicação, ele logo descobriu que uma antiga estrada romana tomava o rumo norte passando bem por trás das casas do outro lado da rua.

Além disso, no ano 117, uma legião de elite havia sido despachada para aquela área, para reprimir uma revolta tribal na Escócia.

A legião, conhecida como IX Hispania Legion, era formada de 4 mil homens.

A legião era chamada também de "Unlucky Ninth", pois, no ano 60, homens da IX Hispania açoitaram a rainha Boadicea, da tribo Iceni da Inglaterra, e abusaram sexualmente de suas filhas.

Boadicea jurou maldição eterna contra eles e, posteriormente, liderou uma revolta que causou muitas baixas na legião.

A IX Hispania Legion reagrupou-se, porém nunca mais voltou a ser a mesma.

Sua marcha para o interior da Escócia terminou misteriosamente.

Ela desapareceu sem deixar vestígios, logo depois de passar por uma região que, alguns séculos mais tarde, viria a chamar-se Dunbíane.

Em outubro de 1984, McKerracher, que não voltou a ouvir aquele estranho ruído e mudou-se para a parte mais antiga de Dunbíane, fez palestra sobre a história local em um clube de senhoras.

Após a palestra, Cecília Moore, membro do clube, procurou-o para dizer que talvez também já tivesse ouvido o fantasma do exército romano.

Acontece que ela morava do outro lado da rua, perto da antiga casa do escritor.

- Uma noite, quando eu estava colocando o gato para fora, ouvi o que me pareceu um exército marchando exatamente sobre meu jardim - informou ela.

McKerracher então concluiu que o incidente ocorrera naquela mesma noite, e no mesmo momento em que ele ouvira os estranhos passos de soldados.

"Estou convencido", escreveu ele, "de que o que ela e eu ouvimos - e o que os animais de meus vizinhos viram - foi a condenada IX Hispania Legion marchando para seu terrível e desconhecido destino, quase 2 mil anos antes."

AUTOR: ALÉM DA IMAGINAÇÃO

sábado, 14 de abril de 2018

SAIBA DOS RISCOS DE PARTICIPAR DE GRUPOS PÚBLICOS NO WHATSAPP

Em seis meses, pesquisadores conseguiram informações sem dificuldade de 45.794 pessoas GETTY IMAGES

Nas últimas semanas, o escândalo da Cambridge Analytica colocou o Facebook na mira de seus usuários mais críticos.

Um deles é Brian Acton, um dos fundadores do WhatsApp, que se juntou a uma campanha para incentivar as pessoas a deixar a plataforma de Mark Zuckerberg: "Chegou a hora. #deleteFacebook", disse ele em sua conta no Twitter.

No entanto, agora é o serviço que ele fundou - e que foi comprado pelo Facebook em 2014 - que tem chamado a atenção sobre quebra de privacidade e exposição de dados.

Um estudo feito pelos pesquisadores Kiran Garimella, da Escola Politécnica Federal de Lausanne (Suíça), e Gareth Tyson, da Universidade de Queen Mary de Londres (Reino Unido), mostrou como é fácil adquirir dados sobre usuários do app que usam os chamados grupos públicos.

Em seis meses, os especialistas conseguiram informações sem dificuldade de 45.794 pessoas. Para fazer isso, eles leram cerca de meio milhão de mensagens enviadas a 178 grupos públicos.
Administradores de grupos do WhatsApp podem torná-los públicos por meio de uma opção chamada "Convidar para o grupo via link" GETTY IMAGES

Por definição, qualquer grupo criado no WhatsApp é privado. Mas seu administrador ou administradores podem torná-lo público por meio de uma opção chamada "Convidar para o grupo via link". Nesse momento, os membros do grupo recebem uma notificação automática.

Em seu site, o WhatsApp recomenda o seguinte sobre o uso desta opção:

Importante: Utilize esta função com pessoas de confiança. É possível que alguém reenvie este link para outra pessoa. Se isso acontecer, essa pessoa também poderá se juntar ao grupo. Nesse caso, o administrador do grupo não precisará aprová-lo.


O que são e como funcionam os grupos públicos de WhatsApp?

- São grupos de conversação que podem ser acessados ​​livremente através de um link.

- Muitos desses links estão disponíveis em vários sites e páginas do Facebook.

- Eles também podem ser fornecidos por um dos administradores do grupo.

- Nestes grupos, são fornecidos todos os tipos de assuntos, desde esportes à política, trabalho, pornografia ou assuntos pessoais.

- Permitem conversar com até 256 pessoas ao mesmo tempo.
Pesquisadores tiveram acesso a números de telefone, fotos de perfil, vídeos, documentos, links para sites e comentários, além da localização dos usuários GETTY IMAGES

Usando a busca do Google, os pesquisadors compilaram uma lista de grupos públicos no WhatsApp. Eles escolheram 200 grupos aleatoriamente e se juntaram a eles.

Os pesquisadores tiveram acesso a números de telefone, fotos de perfil, vídeos, documentos, links para sites e comentários, além da localização dos usuários. E em nenhum momento violaram normas da plataforma.

O popular aplicativo - que tem mais de um bilhão de usuários ativos por dia - armazena todas as informações fornecidas por seus usuários no banco de dados local do dispositivo que eles usam. O problema é que ele armazena a chave para descriptografar os dados no mesmo lugar - a memória RAM.

Os pesquisadores entraram nestes grupos usaram um telefone "velho" da Samsung e executaram uma série códigos aparentemente fáceis de implementar, aproveitando-se de uma "falha no projeto".

O processo, asseguram, requer "pouca intervenção humana".

O WhatsApp tem defendido, desde a sua criação, a criptografia de ponta a ponta, uma criptografia única, que não precisa de códigos secretos ou especiais para proteger a privacidade e evitar que terceiros acessem dados privados.
#deleteWhatsApp

Este não é o único problema de segurança que a plataforma enfrentou em seus nove anos de existência.

No final de 2017, veio à tona uma falha que permitia espionar os usuários. Tratava-se de uma vulnerabilidade que foi revelada por um engenheiro de computação que estava relacionada com o "tempo de conexão" no status de contatos.

De acordo com os desenvolvedores do WhatsApp, essa falha já foi resolvida. Mas as dúvidas sobre a segurança em torno do uso da plataforma continuam.
No final de 2017, veio à tona uma falha que permitia espionar os usuários do aplicativo GETTY IMAGES

No fim das contas, o aplicativo de mensagens pertence ao Facebook. E, desde o ano passado, é de conhecimento público que ele compartilha com a rede social os números de telefone de seus usuários - entre outras informações, como o tempo de conexão.

E, enquanto Acton nos pede para deixarmos o Facebook, muitos estão agora se perguntando se é chegada a hora de também apagar o WhatsApp.

Um deles é o pesquisador de origem indiana Vivek Wadhwa, da Escola de Direito da Universidade de Harvard, nos Estados Unidos.

"O WhatsApp precisa olhar no espelho", escreveu ele na semana passada em seu blog, no qual fala sobre o trabalho de pesquisadores europeus sobre os grupos públicos.

"Facebook e sua 'família de empresas' estão sendo um tanto informais sobre a privacidade. [...] É hora de pedir-lhes explicações sobre as falhas nos seus produtos e como deixam exposta a nossa privacidade."

AUTOR: BBC

quinta-feira, 12 de abril de 2018

POR QUE A FALTA DE FÓSFORO NO UNIVERSO REDUZ A CHANCE DE SE ENCONTRAR VIDA EXTRATERRESTRE

Pesquisadores da Universidade de Cardiff estudaram a nebulosa de Caranguejo em busca de rastros de fósforo NASA/ESA/J. HESTER/A. LOLL (ASU)

Muito além dos palitos que usamos para acender fogo, o fósforo tem um grande papel na origem da vida. E uma astrônoma britânica que comandou um estudo sobre a presença de fósforo em supernovas disse acreditar que as chances de vida extraterrestre são menores do que se pensa justamente pela falta do elemento no universo.

"Sob condições químicas pobres em fósforo, pode ser que seja realmente difícil que a vida se origine em um mundo similar ao nosso", disse a astrônoma da Universidade de Cardiff, no Reino Unido, à agência Press Association.

Utilizando o telescópio britânico William Herschel, localizado nas Ilhas Canárias (Espanha), Greaves e sua equipe buscaram rastros de fósforo e ferro na nebulosa de Caranguejo, localizada a 6,5 mil anos-luz de distância, na constelação de Touro.

Para sua surpresa, Greaves não encontrou ali suficiente quantidade de fósforo para permitir que surgisse vida em novos planetas tal como a conhecemos na Terra.

Ainda que os cientistas pretendam prosseguir com esses estudos em outros resquícios de supernovas, "a rota para levar fósforo a planetas recém-nascidos parece bastante precária", agregou Greaves.

Em entrevista à BBC, Greaves, que recentemente apresentou os resultados preliminares de suas pesquisas sobre esse elemento na Semana Europeia de Astronomia e Ciência Espacial, em Liverpool, explicou que "o fósforo é um entre apenas seis elementos químicos realmente importantes" para o surgimento de vida.

A seleta lista, prossegue, é formada por carbono, hidrogênio, nitrogênio, oxigênio, enxofre e, por fim, o fósforo, essencial para o armazenamento e a transferência de energia entre as células. O fósforo, segundo a astrônoma, é crucial ao componente Adenosina trifosfato (ATP), que as células dos organismos vivos usam para armazenar e transportar a energia usada na atividade celular.

"Como astrônoma, me dei conta de que não havia estudos sobre o fósforo cósmico, então pensei: devemos rastreá-lo desde seus primórdios, em termos astronômicos", destaca.

O fósforo é um dos elementos químicos criados nas supernovas - as maciças explosões de estrelas - e por elas lançados ao espaço.

"Esses elementos viajam e terminam em grandes nuvens de gases na nossa galáxia. Em algumas dessas nebulosas se formarão futuras gerações de estrelas e planetas", explica a pesquisadora.
Vida na Terra depende de seis elementos químicos básicos: oxigênio, carbono, hidrogênio, nitrogênio, enxofre e fósforo GETTY IMAGES

AUTOR: BBC

domingo, 8 de abril de 2018

O DIA EM QUE A CIA SEQUESTROU UMA NAVE DA UNIÃO SOVIÉTICA

Durante giro internacional em que a União Soviética exibiu seus feitos espaciais, agentes americanos sequestraram uma nave do programa Luna CIA

Pouco mais de 8 horas: esse foi o tempo que quatro agentes da CIA (agência de inteligência americana) tiveram para desarmar, fotografar e remontar uma famosa nave espacial soviética. Sem deixar rastros.

Isso aconteceu há cerca de 60 anos - em algum momento entre 1959 e 1960, mas documentos secretos da agência não deixam claro uma data mais exata. O período era de tensão entre os Estados Unidos e a então União Soviética, envolvidos em uma Guerra Fria que, entre outros desdobramentos, levou a uma verdadeira corrida espacial.

Etapa 1: Espionagem

Depois de colocar em órbita o Sputnik, o primeiro satélite artificial da história, e enviar a cadela Laika para o espaço, os soviéticos deram início a outro ambicioso programa espacial chamado Luna, apelidado Lunik no Ocidente.

Em setembro de 1959, a espaçonave Luna 2 se tornou a primeira sonda a tocar a Lua. Um mês depois, a Luna 3 fez história ao fotografar o lado oculto da Lua.
Lado oculto da Lua foi fotografado pela primeira vez em 1959 por uma sonda soviética NSSDC

Diante do sucesso, os soviéticos decidiram embarcar, entre 1959 e 1960, em um giro internacional para exibir seus feitos industriais e econômicos.

E incluíram, na caravana, um veículo espacial do programa Luna. Mas havia dúvidas de se se tratava de uma réplica ou do modelo verdadeiro.

"Uma quantidade de analistas da comunidade americana suspeitava que poderia ser (o modelo verdadeiro), e foi montada uma operação para averiguar isso", dizem os documentos sobre o caso revelados ao público pela CIA em 1995, sob o título O sequestro de Lunik.

Em um dia não identificado, em um país não especificado, agentes americanos visitaram a exibição dos soviéticos e conseguiram chegar à nave para constatar que se tratava, de fato, de uma sonda real - porém, sem o motor e outras peças mecânicas.
Modelo da Luna segundo um documento da CIA - CIA

No entanto, para fazer uma análise aprofundada, era preciso ter acesso à nave para além do contato em uma exposição - onde a máquina era fortemente vigiada por guardas.

Foi então que elaborou-se um roteiro digno de cinema.

Etapa 2: Sequestro

Os agentes passaram a monitorar a passagem da nave em turnê por diferentes cidades, buscando uma oportunidade para interceptar a carga e sequestrar a sonda.

A CIA partiu do pressuposto de que a Luna estava no último caminhão da frota.

Assim, em um dado momento, os agentes americanos, disfarçados, conseguiram parar o automóvel.

"O condutor original foi escoltado a um quarto de hotel, onde passou a noite", dizem os documentos oficiais. "O caminhão foi rapidamente conduzido (com um novo motorista) a um depósito que havia sido alugado para a ocasião".

Por 30 minutos, os agentes esperaram em silêncio e conseguiram constatar que "não havia nenhum indício de que os soviéticos suspeitavam de que havia algo errado".

Foi então que, por volta de 19h30, quatro especialistas chegaram para coletar informações científicas.
Etapa 3: Desmonte e pesquisa

Os envolvidos na missão sabiam que a Luna tinha suas paredes aparafusadas, fazendo do teto a única alternativa para que pudessem entrar sem deixar rastros.

O que eles não esperavam é que, na parte interna da sonda, teriam pouco espaço para se locomover. Eles precisaram então se dividir para estudar a nave em segmentos.
KEYSTONE/GETTY IMAGESNesta semana, completaram-se 50 anos desde a morte do astronauta soviético Yuri Gagarin, o primeiro a ir para o espaço

Iluminando o maquinário com lanternas de mão, os agentes desmontaram peças-chave da Luna, tiraram fotos e fizeram anotações. Depois, colocaram tudo de volta ao seu lugar.

"Juntamos os nossos equipamentos e fomos buscados por alguns carros às 4h da manhã", detalha um dos documentos revelados.

O motorista inicial do caminhão voltou, pegou o automóvel e levou ao próximo ponto como previsto pelos soviéticos - que aparentemente nunca desconfiaram de nada.

Segundo a CIA, "até o dia de hoje não há indício algum de que os soviéticos tenham ficado cientes de que a Lunik foi tomada emprestada por uma noite".

Etapa 4: Aprendizados

As informações obtidas naquela noite se mostraram muito valiosas.

Segundo um documento da CIA tornado público em 1994, foi possível, na missão, identificar o peso e o tamanho de várias peças da sonda, como o motor.
A primeira grande vitória dos americanos sobre os soviéticos na corrida espacial foi a chegada do primeiro homem à Lua AFP / NASA

Isto permitiu se repensar a tecnologia espacial que vinha sendo desenvolvida pelos Estados Unidos, até então sem tanto êxito quanto os soviéticos.

Ainda assim, seria preciso ainda uma década para que os Estados Unidos conquistassem uma vitória na corrida espacial.

Nos anos seguintes, foi a União Soviética que levou o primeiro homem ao espaço (Yuri Gagarin) e a primeira mulher (Valentina Tereschkova), que conquistou o voo orbital mais longo (5 dias) e que possibilitou que um humano, Alexei Leonov, realizasse pela primeira vez uma caminhada espacial.

A grande conquista americana aconteceria em 20 de julho de 1969, quando a Apollo 11 chegou à Lua, levando Neil Armstrong a dar o primeiro passo ali.

"A União Soviética perdeu sim a corrida com a chegada (americana) à Lua, mas a contínua presença do ser humano na órbita se deve muito à determinação soviética e russa de conquistar o espaço", disse à BBC Gerard de Groot, professor de história moderna da Universidade St Andrews, no Reino Unido.

AUTOR: BBC

quinta-feira, 5 de abril de 2018

CONHEÇA A SEITA QUE ACREDITA QUE O MUNDO FOI COLONIZADO POR ALIENS E PREOCUPA GOVERNO HOLANDÊS

A doutrina avatar foi criada por Harry Palmer, um ex-líder da cientologia

Relatos da infiltração de membros de uma seita em escolas na Holanda têm preocupado as autoridades do país. Uma reportagem de uma rede de televisão local encontrou ao menos seis escolas particulares que são guiadas pelos princípios da "ideologia do avatar".

Mas o que seria essa ideologia, cujo nome é o mesmo de um filme que se tornou uma das maiores bilheterias da história do cinema? Qual a sua real influência?

Os membros da seita, que exploram práticas controversas como o exorcismo, dizem que seu objetivo principal é criar "uma sociedade planetária iluminada". Alguns acreditam que o planeta Terra tenha sido colonizado por alienígenas.

A avatar foi criada em 1986 por Harry Palmer, ex-membro da cientologia - também bastante polêmica, a doutrina foi fundada por L. Ron Hubbard e tem entre os adeptos astros do cinema como Tom Cruise, John Travolta e Elisabeth Moss.

Ambas acreditam que em algum momento a terra foi colonizada por seres de outros planetas.

Em e-mail enviado à BBC a partir de Orlando, nos Estados Unidos, Palmer disse que sua comunidade tem quase um milhão de seguidores em todo o mundo.

"A doutrina básica de avatar é a seguinte: o que você acredita tem consequência em sua vida", diz ele.

"Nosso curso não promove uma filosofia além disso. Temos pessoas de todas as religiões. O que avatar ensina são ferramentas, técnicas e processos para você assumir o controle de sua própria mente, conectando crenças e ações às consequências", escreveu.

No e-mail, ele enviou sugestões de três minicursos para explorar a doutrina avatar.

Normalmente, os seguidores pagam por esses cursos, o que acaba gerando dinheiro para a empresa de Palmer, a Star Edge. Os preços variam entre US$ 350 (R$ 1.650) por cinco dias de aulas a U$ 7.500 (ou R$ 24.700) por treze dias.

Pessoas qualificadas como "mestres" ou "magos" podem oferecer suas próprias aulas. Porém, uma parte dos lucros deve ser revertida ao Avatar HQ.

Palmer acredita que existam dezenas de milhares de discípulos da avatar vivendo na Holanda.

A Sektesignaal, ou "alerta de seita", - uma organização holandesa criada para monitorar esses movimentos - pediu à Inspetoria de Educação do país para investigar relatos de que a avatar representa uma ameaça, pois teria infiltrado membros secretamente em instituições públicas.
A escola holandesa Guus Kieft foi apontada como uma das que tem membros da seita avatar

"Não estamos dizendo que isso (a doutrina) é certo ou errado", disse Karin Krijnen, gerente da organização. "Apenas estamos preocupados se houve abusos ou má conduta. É por isso que pedimos uma investigação".

Recentemente, três conselheiros educacionais holandeses atingiram altos status dentro da seita e usaram dinheiro público para enviar outras pessoas para participarem de cursos sobre a avatar.

Han Bekkers, 69 anos, secretário municipal da província de Limburg, no sudeste da Holanda, foi um dos mencionados nos relatórios. Seu porta-voz, Roek Lips, disse à BBC que os relatos eram "quase sem sentido".

"Han Bekkers fez o curso, mas não há dinheiro público envolvido", diz Lips. "E nada do que ele arrecada com suas oficinas é enviado para a Star's Edge, ele é totalmente independente."
Quais as semelhanças entre avatar e cientologia?

Os cursos e a doutrina avatar compartilham muitas concepções e terminologias da cientologia. A igreja oficial da cientologia até já processou Palmer por usar um seus logotipos sem autorização. Palmer deixou de usar a marca e logo depois lançou sua própria filosofia.

Ele também usou termos cientólogos típicos, como "resumo", "integridade" e "profissional"

Os cientologistas negam que sejam parte de um culto e rejeitam acusações de abuso e fraude - a igreja já foi acusada de sonegar impostos e até de torturar alguns de seus membros. Os seguidores descrevem a religião como apoio espiritual.

Os programas avatar de autodesenvolvimento também emprestam elementos do xamanismo, do hinduísmo e da filosofia nova era.

A palavra avatar vem da mitologia hindu e se refere à "manifestação da alma liberada na forma corporal da Terra".

Avatar está na escola?
Samuel Dirkse é professor na escola Guus Kieft, que teriam membros da seita avatar

A BBC decidiu procurar provas da presença de avatar em uma das escolas mencionadas nos relatórios holandeses. Uma das escola que consta no relatório como uma instituição com membros avatar, conhecida como Life!, afirmou que um de seus professores realmente fez um curso da doutrina, mas que ele nunca ensinou nada da "filosofia" a seus alunos.

Ao sul de Amsterdã, desviando de poças lamacentas ao longo de uma trilha de terra, e com o barulho dos aviões do aeroporto de Schiphol, entramos na escola Guus Kieft, na cidade de Amstelveen.

Na entrada, conhecemos o professor de sociologia Samuel Dirkse, que estava segurando uma xícara de chá e usava um gorro.

"Nunca ouvi falar de avatar", diz ele. "Conheço o filme, claro, mas nada sobre cientologia. É a primeira vez que ouço falar sobre isso".

Uma de suas colegas já fez o curso avatar, segundo o relatório da organização que procura seitas. "Ela nunca mencionou nada sobre isso antes. Era só um desenvolvimento pessoal", diz o professor.

"Os pais dos alunos estão com medo, porque eles leram o relatório e pensaram que existe uma seita. Os jornalistas não vieram aqui, eles apenas fizeram acusações. Alguns estudantes estão muito nervosos. Agora as pessoas olham para eles como se eles fossem parte de um culto".

As escolas democráticas ou livres costumam atrair pais holandeses que acreditam que seus filhos vão se destacar em ambientes menos controlados.

Um número razoável de escolas primárias e secundárias oferece aulas de desenvolvimento pessoal cujo objetivo é "identificar e remover crenças limitadoras".

A Guus Kieft, por exemplo, parece uma escola de teatro: quando a visitamos, um garoto dedilhava violão sentado em uma mesa e uma adolescente olhava seu celular enquanto ouvia música em seus fones.

Zeno, um menino de 14 anos, pareceu confuso com a sugestão de que sua escola era dirigida por magos. "É um absurdo. Eu nunca soube o que era avatar", disse ele.

Sua mãe, Christel van Zweden, explica que escolheu uma escola alternativa para livrar seu filho da pressão por notas e desempenho.

"As escolas precisam ser livres de ocultismos e extremismo. Elas precisam ser neutras. Sou contra a cientologia, sou contra a avatar, sou contra qualquer tipo de doutrinação", diz ela.

"Agora, com esse relatório, virou uma espécie de caça às bruxas. Todo mundo está apontando o dedo porque conseguimos fazer uma escola diferente aqui. Tenho certeza que não há nenhuma lavagem cerebral aqui", afirma.

Do outro lado da rua da escola Guus Kieft, um vizinho, Jurgen Seunke, andava com seus labradores na chuva. Questionado se estava preocupado com os relatos de uma seita logo ao lado, ele respondeu que não.

"Há quem leia a Bíblia e diga que as crianças não devem tomar vacina contra a poliomielite ou que não devem aceitar homossexuais porque Deus não gosta deles", ele diz. "Então, mesmo que a cientologia exista na escola, todos devem ter a liberdade de escolher. E, de qualquer forma, são apenas alguns garotos, certo? Não é como se eles tivessem um exército ou algo assim."

AUTOR: BBC
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